Adjectivar pessoas

Contra mim falarei, talvez  a jeito de mea culpa, mas penso cada vez mais nesta mania de adjectivar os outros, que é como quem diz, chamar-lhes nomes.
Baseados numa qualquer julgamento, preconceito, na necessidade de atacar uma característica em alguém, diminuindo-a. Diz que esta adjectivação dos outros também tem um lado bom, fofinho, como as alcunhas entre casais, "leoa" ou "ursinho" ou assim...
Uso e abuso de adjectivação, o que na escola sempre me rendeu valentes composições que faziam chorar as minhas colegas que suavam por encher 5 linhas de texto na parte final dos testes quando eu pedia outra folha à "prof" para continuar a debitar flores e cores e "inhos" e "ões" e montes de clichés e frases feitas, preenchidas por adjectivos enjoativos. Consigo fazê-lo, portanto, com distinção. Mas uma coisa é descrever uma porta, como aquela cena dos Maias das 2 ou 3 páginas a descrever a entrada no solar não sei das quantas. Outra coisa, é falar de pessoas, e nem sempre no bom sentido...

O que questiono é o que isso faz de nós, o cognome que oferecemos a outrem, o que diz de nós? Se tenho dificuldades em lembrar-me dos nomes dos amigos dos meus filhos e digo: o gordo, o cenoura, o cabeludo, o lingrinhas, o nãoseiquê... o que é que isto diz de mim? Penso que um desinteresse enorme pelos amigos dos filhos e um exemplo horroroso de catalogação...
Acreditem que consigo identificar amigos dos meus filhos pelos nomes acima descritos, é uma pena mas consigo. Fui criada assim, a ver as diferenças... No entanto, não os trato assim, não falo assim com os meus filhos sobre os seus amigos. Porque estou a criar pessoas, o futuro. E já me basta ter que levantar a sacudir a poeira de tantos anos de exposição a uma sociedade que tem muito de mau e preconceituoso e feio para nos dar e era bom que os hoje miúdos fossem criados de uma forma mais limpa, menos acusatória, com menos rótulos.
Porque em vez de os meus filhos dizerem:
- "olha o cenourinha", que apreciem a particularidade de um cabelo raro e maravilhosamente ruivo!
Em qualquer diferença, que reconheçam o valor da liberdade de se ser único e especial...
Este texto acabará por ser um note to self, para me lembrar de não apontar o dedo. Mas acredito que fomos expostos durante muitos anos a fazer distinções e isto do "todos diferentes todos iguais" é coisa que vai demorar a passar de cliché bonito...
Posto isto, não faço ideia porque me pus a debitar sobre este tema. Tenho a certeza que não foi por isto que abri o blogger. Devia fazer psicanálise, ou assim...

2 comentários:

  1. És generosa nas adjectivações, isso é o mais importante. Beijinhos!

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  2. não sou muito de adjectivações, porque tenho uma memória valente que me permite fixar nomes e rostos (sei os nomes dos putos todos que são amigos do meu mais velho, do outro logo tratarei disso...).

    o que faz com que... quando recorro a adjectivação, ela é intencional, é premetidata e muitas vezes demasiado "honesta"... o que já me valeu valentes vergonhas... porque o mundo é muito pequenino...

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